5/28/2016

Onda fragorosa.

Abro os olhos e a sala gira
Fecho os olhos e o mal estar se inicia
Abro os olhos e a cabeça lateja 
Fecho os olhos e a ânsia se instala.

Procuro por água
A boca seca indaga 
Forço a memória até o último momento
Dez cervejas atrás, é tudo que lembro.

Levanto e checo minha palidez refletida
Cabelo desgrenhado anuncia
A noite foi boa
Mas o tormento vai ser o resto do dia.

Mato a sede em um gole
O enjoo contamina
Pílulas não surtem efeito
Jaz vontade de vida.

Deito-me outra vez
A dor parece vazia
Adormeço num súbito 
E assim recomeço todo incômodo.

Acordo fazendo promessas ao vento
Coisa de quem se arrepende por um instante ou menos
Sabendo que amanhã tudo se reinicia
E a ressaca será, outra vez, minha companhia. 


5/24/2016

Labuta.

Me canso fácil das coisas - e das pessoas. É preciso muita habilidade emocional pra lidar comigo. Tudo é muito bonito pra mim, nos primeiros trinta segundos. E depois passa, fica normal e eu volto ao meu torpor diário.

Confesso que não é nada fácil lidar comigo. Tenho esse probabilidade de me entendiar com a coisa mais legal que existe e com a pessoa mais interessante que já conheci. E nada disso é culpa de ninguém, além de ser minha.

Quase sempre estou desligada interiormente, de modo que nada me anima ou me entristece. Só continuo seguindo o fluxo do que já está predisposto a acontecer. A corrente me leva rio a baixo e eu não me importo.

Mas há um momento, um pequeno momento dentro do tormento, que algo me faz ascender e acender. Transcender. Há um momento em que eu abro os olhos e eu quero enxergar o que está a minha frente. Há esse pequeno momento lúcido da vida em que eu sinto o sol brilhar sob mim e me sinto inteira, completa.

Esse pequeno momento é tão raro, mas justo. Eu não saberia viver dentro da utopia funcional do qual a humanidade parece viver. Ser feliz o tempo todo me parece frustrante. Gosto muito da minha solidão para sentir essa euforia o tempo inteiro.

Aprazimento.

Alguém que me olhe e me sinta, me olhe e me veja, me olhe e me tenha. Alguém que entenda meus delírios, anseios, preceitos, conceitos e rodeios. Alguém que me instigue, me intensifique, me acredite, me mime.

Alguém que pergunte sobre meu dia com real interesse, que me dê bom dia com aquele sorriso preguiçoso de como a gente acorda num dia bom. Que me dê boa noite com aquele ar cansado da rotina fatigada também.

Alguém que se interesse pelo livro que estou lendo no café da manhã e me pergunte a respeito, que me incentive a leitura matinal e me indique um punhado de livros pro resto da semana. 

Alguém que compartilhe comigo seu seriado favorito, seu livro de cabeceira, seu chocolate preferido, seu filme de infância e tudo aquilo que nunca ousou contar para nem uma outra pessoa. 

Alguém que deite e não durma. Que deite e role. Que deite e gargalhe. Que deite e me faça cócegas. Que deite ao meu lado, mas que não se levante logo em seguida.

Alguém que transe. Que foda. Que faça sexo. Que faça amor! 

Alguém que beije orelhas, pescoço, boca, olhos, braços, pernas, boceta, barriga, cabelo. Alguém que beije minha alma! 

Alguém que faça conspirações sobre o universo, sobre a vida, sobre o amor, sobre relacionamentos, sobre astrologia. E que, no fim de tudo, me olhe como se a maior conspiração fosse me entender.

Alguém que ria sem em momentos oportunos, que faça piadas ruins em situações serias, que esbarre o dedo mindinho nos móveis e xingue horrores. Alguém que seja um filho da puta louco tanto quanto eu sou. 

Alguém. 

5/21/2016

Êxodo

Você costumava me ajudar a levantar da cama e sorrir para o reflexo no espelho, me dizia que era naquela pessoa refletida que eu deveria confiar e só a ela eu deveria dar ouvidos. Eu costumava sorrir ao lembrar das tuas palavras de auto-ajuda, eu costumava ir até o espelho e olhar no fundo dos olhos do meu próprio reflexo e me forçar a sorrir, mesmo que aquilo doesse por dentro.

Você costumava me ligar tarde da noite pra perguntar como foi meu dia, mesmo sabendo que a resposta era a mesma da noite anterior. Você não se importava, você estava lá para ouvir meus delírios e crises existenciais. Eu costumava olhar o relógio de minuto em minuto até dar o horário que você me ligava, e quando não acontecia eu me afundava dentro de mim.

Você costumava entrelaçar nossas mãos quando andávamos pelo parque, me contava sobre coisas que eu nunca saberia e eu tentava não parecer completamente fascinada - mesmo que isso fosse tudo que eu costumava ficar na tua presença. Mas quando a noite caía e nos despedíamos, eu voltava para casa entrelaçando minhas próprias mãos em minha cintura porque eu não conseguia pensar que você não estaria ali para segura-las quando a madrugasse chegasse.

Você costumava cantar para eu dormir. Canções tão bonitas que ainda ecoam pela minha mente. Mas quando eu adormecia, os pesadelos voltavam com força e eu sempre acordava suando e gritando.

E mesmo com toda a sua ajuda, a sua presença, a sua tentativa de me salvar, você não conseguiu. Você costumava ser meu porto seguro, um alicerce, enquanto eu era só uma grande rocha atrapalhando a sua vista e seus passos. Você não conseguiu me salvar porque eu não queria ser salva. Eu não queria sentir aquela felicidade outra vez e te ver partir no auge desse sentimento.

Então eu parti. Porque eu não sei ficar, porque eu não sei amar, porque tudo é facilmente corrompido com o tempo, porque eu não queria ver aquela felicidade se instalar e depois se quebrar. Eu parti porque eu amava você o suficiente pra não te trazer para o vazio que eu costumava ser.

Eu parti porque todas as mulheres dentro de mim te amavam demais para te fazer infeliz.

Torpor

Tenho me estragado diariamente. Pacotes inteiros de cigarros são consumidos pelos meus pulmões em poucas horas dentro de uma extensa madrugada. A noite corrói meu coração ardente e a sensação de vazio não esvai quando o sol aparece. É quase como morrer, mas continua-se vivo. E, talvez, essa seja a pior morte: quando já não sente nada e continua, sem fé alguma, em frente.

Tenho morrido diariamente. Doses atrás de doses de bebidas baratas que pago com um cartão que consegui depois de trinta dias em pé numa loja que eu costumava odiar. O dia corrói minha alma selvagem e a sensação de utopia assombra minha mente eufórica. É quase como não sentir, mas continua doendo. E, talvez, essa seja a pior dor: quando já não se entende pelo que sofre, quando só sabe sentir a mesma dor e aquela parcela de culpa, sem entendimento algum do que passa.

Tenho me anulado diariamente. Conversas que nunca me dão respostas com pessoas que nunca fizeram parte da minha vida estão presente como nenhum amigo ou amor esteve. A tarde parece matar meus sonhos tórridos e solitários. É quase como entender, mas continuo sem entender absolutamente nada do que se passa dentro e fora de mim. E, talvez, esse seja o pior de mim: quando tudo está quieto demais na superfície e eu continuo me mutilando por dentro.

Eu teria te amado, se você deixasse.

Sempre penso em como teriam sido as coisas se você tivesse me dado abertura para entrar na sua vida. Sempre penso em como, talvez, poderíamos estar deitados agora, as três e pouco da manhã de uma sexta-feira fria, no chão, falando sobre coisas aleatórias da vida ou não falando. Eu me contentaria de estar, neste momento, olhando teus olhos castanhos.

Sempre tento lembrar qual parte eu pulei, qual o erro que cometi, qual a sentença que esqueci. Sempre volto aos dias em que você ainda estava por perto - mesmo que longe - e não consigo entender como eu não consegui chegar até você. E isso me machuca porque pensar no que poderia ter sido corrói minhas veias.

Gosto de pensar, vez ou outra, no que teríamos sido um para o outro, que tipo de romance findaríamos para a eternidade, que tipo de cicatrizes possivelmente teríamos deixado na alma um do outro. Por outro lado, penso sempre que poderíamos estar juntos. Ainda ouço sua voz rouca e grave ecoando em minha mente toda vez que penso em você.

E apesar de nunca termos tido absolutamente nada, nem um tipo de conexão - além daquela que criei dentro da minha mente -, sinto uma profunda ternura por você. Um tipo de carinho tão imenso que me dói saber que você, outra vez, está com o coração partido. Algo que eu, em plena consciência, jamais faria. Me rasgaria a alma se algum dia eu tivesse a capacidade de te machucar. 

"(...) Acho que tem seu lado bom e rolam estresses, como tudo na vida. É uma delícia estar apaixonado, amar uma pessoa... rola confrontos, ciúmes, mas é gostoso ter alguém com quem sorrir, chorar e compartilhar. Só que, mais uma vez, como tudo na vida, relações são efêmeras, e a ferida que fica não é algo que fecha. A cicatriz em mim dói de uma forma que não vale a pena."