Eu gostava daqueles olhos castanhos grandes e brilhantes. Eu
gostava daquelas pintas perto da boca e dos olhos. Eu gostava daquele sorriso
meio mágico, meio safado, meio menino. Eu gostava daquele cabelo rebelde que
você sempre me dizia que iria pintar e eu reprovava. Eu gostava daquelas
pequenas partes de você que mais ninguém no mundo conhecia, apenas eu. Eu
gostava do mau humor matutino que logo transformava-se em sorriso quando eu
afogava minha boca na sua. Eu gostava daquela cara de sono, daquelas olheiras
profundas e do sorriso matinal que me dava e me dizia “bom dia, amor!” e virava
pra dormir mais um pouco. Eu gostava quando você choramingava pra eu te deixar
dormir mais um pouco. Eu gostava do fato de eu ser baixinha o suficiente pra
minha cabeça ficar na altura do seu ombro, tão perto do coração e tão perto do
abraço – e eu podia ter os dois ao mesmo tempo: teu abraço e teu coração
batendo mais forte. Eu nunca te disse essas coisas por que sempre soaram-me tão
bobas e inúteis, coisas que eu achei que você sabia e eu não precisava mais te
falar. Mas você nunca soube dessas e das outras coisas que eu gostava em você.
Eu gostava do modo como se preocupava comigo e me deixava chorar no seu colo,
mesmo que você nunca soubesse direito o que fazer ou o que me falar. Eu gostava
do modo como você se refugiava da vida, buscando felicidade em pequenas coisas
pra desfazer-se do mundo real tenso que vivia. Eu gostava do modo como falava
de nós e de como nos via no futuro, mesmo que ainda não estivesse pronto para o
tal futuro. Eu gostava tanto de quando falava sobre como seria o filho que
nunca tivemos. Eu gostava de quando saia do banho enrolado na toalha e sorria
pra mim pelo reflexo do espelho. E aquele era o meu sorriso favorito no mundo
inteiro. E eu gostava tanto, tanto, do fato de que ao sair de casa a primeira
coisa que você fazia era me dar a mão e me deixar andar pela calçada para que
eu ficasse um tantinho mais alta. Eu gostava daqueles beijos de ponta cabeça,
dos selinhos, dos beijos no nariz, na testa, na mão, no cantinho da boca, no
pescoço, no lóbulo da orelha. Eu gostava do seu modo de me abraçar – e eu sei,
eu talvez, em algum momento desse texto, já tenha dito isso mas é que eu
realmente gostava muito disso. Eu gostava, também, das nossas brigas. Do modo
que eu ficava tão furiosa e berrava e você sempre me perguntava em tom calmo
porque eu estava gritando. E eu gostava do modo que um dos dois perdia a graça,
o jeito e o orgulho e partia pro colo um do outro. Eu gostava dos dias chuvosos
preguiçosos que duravam uma eternidade. Eu gostava dos dias nos fast-foods
afora porque tínhamos preguiça de cozinhar alguma coisa. E eu gostava dos
filmes na TV nos fins de semana, mesmo que estivesse acontecendo a maior festa
do ano. Eu gostava da maneira como não
gostávamos mais de sair de casa como antes ou de nos socializar com pessoas
além daquelas que já conhecíamos. Eu gostava do fato da sua mão sempre procurar
a minha enquanto a outra continuava no volante. Eu gostava do modo como você
fechava os olhos e sentia meu carinho pelo seu rosto e sorria tão suavemente
que às vezes achava que iria adormecer. E eu gostava tanto, tanto, de você. Eu
gostava da maneira que éramos um com o outro. Eu o amava. Do fundo do meu
coração. Mas eu amanheci num dia comum e você amanheceu num dia decisivo. E se
foi. E partiu meu coração. E levou parte de mim consigo no momento em que me
disse que não haveria mais um amanhã juntos. E agora amanheço todos os dias
tentando me lembrar se existia alguma coisa em mim que eu gostava que você
também não tenha levado de mim.
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