8/16/2011

Literatura de Cordel.

Não sei por onde começar, há dias tento escrever-lhe esta carta mas nunca consigo juntar uma frase lógica. Posso começar perguntando como está Paris mas sei que andas muito bem por aí, Leninha me ligou semana passada e disse que o tinha visto com a barba feita e andando de mãos dadas com alguma rapariga. Deus, quis morrer quando ouvi isso sair da boca dela. Adorava tua barba mal feita e ambos sabemos que você também adorava que eu adorasse isso em você porque daí tu não precisava faze-la de dois em dois dias, mas tu tá com essa rapariga, ela não deve gostar de homens barbudos. Por falar nisso, ela gosta de bandas indies? Costumávamos idolatra-las, lembra-se? Só acharia estranho se você estivesse com alguém que não gostasse das coisas que tu gosta. E, mais uma coisa, ela já conheceu teus pais? Se sim, dê apenas um recado a ela: eles só são chatos nos dois primeiros meses, ela precisa aguentar um pouco, depois teu pai a chamará pra tomar biscoitos e chá na sacada da casa dele e a tua mãe irá querer leva-lá para fazer compras, lembre-se de avisa-lá para escolher apenas a segunda opção de peça que a tua mãe escolher, ela sempre diz que gosta da primeira peça querendo testar se você mentirá para agrada-la.
Por falar em Paris, soube que seu curso de férias acabou. Acho que conseguiu aprender um pouco mais de espanhol agora, não é? E isso me faz pensar quando você irá voltar. Há muito tempo você se foi, bom, fazem quase três anos. Tenho escrito e apagado muitas mensagens e acho que essa será a única que vai chegar em você, acho que essa é diferente das outras, essa não tem muitas palavras carinhosas pra você, nem muito ciúmes, acho que tem muita saudade... isso tem sim, e muita.
Andei pensando em nós esses dias (tudo bem, andei pensando muito em nós durante esses quatro anos longe um do outro) e percebi que a minha casa ainda tem você nela. Nunca tirei nossas fotos do mural ou rasguei aquelas cartas do fim de agosto quando você esteve em Londres, eram três cartas por dia, lembra-se? Sempre gostei da quinta carta, tinha cheiro de rosa e uma música meio chata ao abrir o envelope, mas sempre foi a minha preferida.
Por falar em casa, me mudei. Voltei a morar com os meus pais aqui em Porto Alegre, assim não corro o risco de esbarrar com nossos velhos amigos pela cidade e ter que dar satisfações que nós não estamos mais juntos. Digo isso porque outro dia, andando em São Paulo, encontrei o Luis, aquele dos cabelos de anjo, e ele perguntou muito sobre você. Tu sabe, comecei a rir um pouco, respirei fundo e disse que não estávamos mais juntos, depois cheguei em casa e chorei por duas horas até pegar no sono. Acordei despenteada e vestido a sua camisa do Internacional, ainda tinha seu cheiro mesmo depois de tantos anos. No dia seguinte que encontrei o Luis, fiz a primeira carta que mandei, só que escrevi o endereço errado. Outro cara leu e se sentiu amado, ou alguma mulher, ou algum velhinho, ou alguma criança.
Essa é a ultima carta que pretendo escrever e embora esteja longa demais para uma simples carta, queria de todo o coração que você me escrevesse vez em quando pra me contar sobre como você está, sobre essa nova rapariga, sobre o livro inacabado, sobre teus pais ou sobre o pôr-do-sol que você faz questão de ver sentado na escadaria do Notre Dame.
Te cuida, guri. Te gosto muito.
Da tua eterna rapariga.

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