Eu era um corpo estranho a mais no mundo, vagando por aí com
uma bagagem repleta de sonhos destruídos e memórias fragmentadas, eu estava
apenas ocupando mais um lugar no espaço que poderia ser dado a qualquer outro
que merecesse mais que eu. E, aquela altura, eu achava que qualquer um merecesse
mais a vida do que eu. Era difícil enfrentar os dias quando tudo que você
queria era continuar na cama até o verão acabar mas sempre havia algo pelo qual
eu levantava naqueles dias e nenhum dos motivos eram sólidos o suficiente para
que eu enfrentasse mais um dia obscuro e mesmo assim lá estava eu, tentando não
falhar na única tentativa que me restou: sobreviver.
Esse era o modo como eu me via, como eu sentia, como eu
olhava para a vida e sentia que ela não me olhava de volta. Eram por esses e
outros motivos que eu rezava para que o dia, o mês e o ano passassem mais
rápido, o suficiente para que aquilo pudesse, um dia, ser enterrado no fundo da
memória e eu decidisse quando eu queria trazer aquilo à tona.
Eu andava vazia, triste e solitária. Haviam, sim, alguns
dias que se destacavam mais que os outros, eram dias agradáveis mas que eu,
provavelmente, não lembrarei quando eu pensar nisso daqui há alguns anos.
Então, ele entrou pela porta de saída dos fundos, a única porta que eu mantinha
aberta para que eu um dia, caso algo piorasse, pudesse escapar. E ele
invadiu tudo aquilo do qual eu tinha medo dentro de mim, ele adentrou todos os
pequenos espaços entreabertos que ficaram em mim e me fez limpar a bagunça dos
meus sentimentos. Ele não se importou com a bagunça, ele só sentou e esperou o meu momento acontecer para que eu me limpasse tudo e desse espaço para coisas novas acontecerem e para que ele pudesse acontecer em mim.
Estar com ele era algo extremamente bom e feliz. Eu queria
poder estar com ele o tempo inteiro mas sei que eu não podia tê-lo a todo instante, por isso que eu
tentava aproveitar ao máximo os momentos que eu tinha com ele. E eu sempre
aproveitava, eu sentia isso, mas nunca me era o suficiente por que quando eu
chegava em casa e caia na cama com aquele sorriso bobo, eu já estava sentindo a
falta dele. E essa era a parte ruim de todo o sentimento bom que eu tinha: me doía sentir tanto a falta de alguém como eu sentia a dele.
O fato dele ter adentrado o meu interior não foi o que me
surpreendeu, o fato dele olhar aquilo tudo, aceitar minha bagagem emocional e
corrompida por tantos problemas e, ainda sim, ficar foi o que realmente me
deixou perplexa. Eu não fazia ideia que, algum dia, alguém pudesse lidar com a
minha bagunça quando nem eu mesma sei lidar na maior parte do tempo. Mas ele me
mostrava o que eu tinha de mudar, por onde eu deveria ir, o que eu deveria
captar de tudo que me acontecia. Era bom tê-lo ao lado pois com ele os dias
cinzas sempre eram bons dias. Não importava como estava o céu lá fora, eu e ele
juntos fazíamos o clima ser extremamente agradável e esclarecedor.
Eu nunca pensei que me sentiria dessa forma outra vez (E estou fadada a pensar se houve, realmente, alguma vez em que estivesse assim). Sempre ouvi dizer que quando você se apaixona é algo inesperado, ninguém é
preparado para a chegada de alguém em sua vida que pretende ficar por muito
tempo, e isso ainda me deixa um pouco receosa e aflita, ainda possuo um medo lá
dentro que grita tão alto que acorda e incomoda todos os sentimentos bons que
sinto neste momento mas tento, ao máximo, não escutar o medo. Eu não preciso
sentir medo do que estar acontecendo porque, dessa vez, eu sei que não sairei
com um coração quebrado. Ele não vai partir o meu coração, ele estaria partindo
o seu se fizesse isso. E a gente sabe o quanto dói um coração partido.
Eu só queria que o relógio que tiquetaqueteia insensivelmente parasse nos momentos em que estivéssemos
juntos porque eu não gostaria de voltar pra casa com a sensação de que estou
deixando algo importante para trás, eu não gostaria de voltar para casa com a
sensação de que você ficou para trás porque eu queria poder te levar comigo
para aonde eu fosse. Eu queria não precisar voltar para casa porque estar com você
era o que eu queria fazer e era no teu abraço que eu queria morar, era em seu
peito que eu queria deitar e repousar minha cabeça cheia de problemas.
Você trouxe o melhor de mim à tona. Eu não sei como lidar
com essa parte de mim, parte que eu não sabia que existia e que eu achei que
nunca veria. Eu sorrio à toa, eu sinto borboletas no estômago e todas as canções
de amor fazem sentido agora. Você é a parte boa em mim e eu não quero perder
isso por nada do mundo.
Agora, quando olho para trás, eu vejo uma estrada bipartida,
com alguns corações quebrados e algumas decepções pelo caminho. Eu ainda vejo
muita coisa da qual eu queria esquecer mas eu já não olho mais com tanta
tristeza e desconforto pois sei que foi um desses caminhos que trouxe você pra
mim e se eu precisei passar por todas essas coisas para te ter, eu ficarei bem
com as memórias e passaria por todas as coisas tortuosas novamente para que, no
fim, pudéssemos ficar juntos de novo. Agora eu vejo que eu vivi a vida achando
que sabia o que era estar apaixonada mas agora é o momento que eu tenho
certeza. E eu sei que estou completamente apaixonada por você.
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